Por Ana Clara Veloso
As mulheres representam 45,6% da força de trabalho no Brasil, atualmente, conforme dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Porém, à medida que o cargo é mais alto, a participação delas cai. Focando em companhias de capital aberto em uma pesquisa realizada este ano, por exemplo, a consultoria McKinsey viu a ocupação de posições executivas por mulheres ficar em 32%. Para mudarem suas realidades internas, algumas empresas, então, estipularam metas e vêm definindo estratégias de recrutamento e promoção das profissionais.
A Schneider Electric, multinacional de produtos e serviços para distribuição elétrica, quer sair de 21% de mulheres chefes no Brasil para o índice de 30% até 2020. Com salários iguais para profissionais de ambos os gêneros, como já acontece hoje.
Na lista de finalistas (três, em média) para qualquer vaga dentro da companhia, cobramos a presença de ao menos uma mulher. Em algumas ocasiões, para vagas e áreas pré-definidas, na ficha do candidato classificado a ser enviada para o gestor, não constam informações como nome, idade, nacionalidade e universidade, tampouco foto, com o objetivo de evitar qualquer tipo de viés inconsciente — explica Magda Beffa, parceira de negócios de Recursos Humanos para América do Sul e líder de Diversidade no Brasil da Schneider Electric: — Em segundo lugar, damos treinamento para os novos colaboradores já nos primeiros 30 dias com o intuito de identificarem e superarem vieses inconscientes. Temos também programas de coaching e mentoria, nos quais nossas mulheres talentos são expostas por meio de encontros com a alta liderança, e 100% das nossas colaboradoras possuem um Plano de Desenvolvimento Individual para aceleração da carreira.
Além da importância social dessa decisão, o estudo da McKinsey sobre o tema, ainda em desenvolvimento, já concluiu que há uma correlação positiva entre diversidade e performance financeira: empresas brasileiras com mulheres na liderança têm probabilidade 50% maior de apresentarem melhor desempenho em rentabilidade.
A volta da licença-maternidade
Nos cargos de diretoria da Natura, a participação feminina fica entre 35% e 40% atualmente. Para chegar a 50% até o fim de 2020, é preciso atuar em um momento-chave, segundo a vice-presidente de Operações e Logística Josie Peressinoto:
— As mulheres já são maioria entrando na nossa companhia. O que percebemos é que há uma grande perda de talentos quando precisam escolher entre a vida pessoal e a profissional. A volta da licença-maternidade, por exemplo, é um momento-chave. Mas elas não deveriam ser forçadas a fazer essa escolha. Por isso, nós a recebemos com um trabalho de mentoria, realizado por lideranças femininas que mostram que é viável equilibrar esses dois âmbitos da vida. E oferecemos berçário em nossas sedes, para bebês de até 3 anos. Há um ano, os homens também podem trazer seus filhos.
A SAP Brasil, empresa de softwares, também tem programa de apoio para mulheres na volta da licença-maternidade, com o objetivo de alcançar, de forma mais acelerada no Brasil, a meta global de 30% de mulheres em cargos de gerência de primeira linha até 2022. Atualmente, elas são 22,5% no país. E por lá, a creche também é um benefício para pais e mães, medida importante para tratar o cuidado com a criança como responsabilidade dos dois, na visão da chefe de operações Adriana Aroulho:
— Temos creche para todos os funcionários deixarem seus filhos de até 4 anos e 11 meses. E a licença-paternidade vai além de 20 dias na SAP Brasil. Damos uma semana a mais, por vontade nossa. Isso é para conscientizar todo mundo de que a gente precisa fazer algo diferente.
Oferecer benefícios para dar equilíbrio aos âmbitos pessoal e profissional da vida de mulheres e de homens foi importante para a empresa farmacêutica Bristol-Myers Squibb, conhecida como BMS, alcançar sua meta. As mulheres são 60% da força de trabalho, 63% das líderes e 64% da diretoria.
— A jornada é flexível, entre 7h e 21h30, sendo acordada com o gestor; é possível fazer até dois dias por semana em home-office; as sextas-feiras podem ser de meio-período, diluindo o restante da carga horária nos demais dias da semana. As mulheres continuam trabalhando na empresa pois têm esse apoio. E crescem, pois processos robustos de desenvolvimento profissional as deixam preparadas para assumir vagas de liderança quando elas surgem — diz a diretora de Recursos Humanos da BMS, Jennifer Wendling.
E quando uma mulher sobe ao cargo, não só ela comemora. Segundo a BMS, como resultado da chegada delas à liderança da área comercial, predominantemente masculina em todo o mercado, a empresa teve um aumento de 22% em participação feminina no setor em um ano. A vice-presidente de Operações e Logística da Natura, Josie Peressinoto, argumenta que representatividade importa:
— Eu vejo muitas meninas com ambição de crescer na área de logística. Isso acontece quando elas vêem exemplos de mulheres com carreiras bem sucedidas na mesma área — pontua ela.
Negras têm menor participação
A diversidade não se faz só de incentivos para contratação e promoção de mulheres. Outros grupos historicamente colocados à margem do mercado de trabalho continuam ascendendo pouco a cargos de liderança. Segundo pesquisa do Instituto Ethos, existem 5% de negros em cargos de liderança no Brasil.
— E quando se aplica o recorte de gênero em cima, a situação é pior. As mulheres negras são 0,4% das líderes. As empresas não pensam nesta questão ou têm programas pequenos, com baixo investimento. É também resultado da falta de representatividade nas posições de cima. Não adianta ter um setor de Recursos Humanos comprometido com a diversidade, se as pessoas que assinam e dão aval para programas não estiverem sensibilizadas às causas — diz Tom Mendes, gerente geral do Instituto Identidades do Brasil (ID-BR), que desenvolve ações para conscientizar organizações e sociedade para igualdade racial: — Deveria causar estranhamento às pessoas que estão no poder o fato de termos maioria da população negra e isso não ser representado nas empresas e nas lideranças.
Algumas das decisões tomadas em favor da equidade de gênero na Bristol-Myers Squibb (BMS) — como ter mais fornecedores com o selo WEConnect, que certifica empresas com ao menos 51% da propriedade ou da gestão da companhia feita por mulheres — foram sugeridas em um dos oito grupos globais focados na discussão de questões de diversidade e inclusão que existem na empresa. No Brasil, cinco estão em atividade, preocupados com questões geracionais, raciais, de mulheres, LGBTs e deficientes.
— Os grupos trabalham em planos de negócios alinhados à melhoria do ambiente de trabalho, cada um com uma prioridade. E qualquer funcionário pode participar deles — explica a diretora de Recursos Humanos da BMS, Jennifer Wendling.
Em julho do ano passado, a BMS assinou uma carta pela igualdade racial, junto ao Instituto Afro Brasileiro de Ensino Superior (Afrobras), para aumentar o número de negros em seu quadro de colaboradores.
Na Microsoft, não há metas numéricas. Mas a diversidade é trabalhada sob os mesmos cinco pilares, cada um com suas missões. Priscyla Laham, diretora de canais e vendas para pequenas e médias empresas, conta que o grupo de negros trabalha questões de pertencimento e desenvolvimento, inclusive para superar barreiras encontradas na formação desses profissionais algumas vezes.
— Hoje, a nossa seleção de estagiários não pede mais o nível de Inglês Avançado. Se a gente tiver um candidato muito bom, a gente insere, para ajudar a pessoa a se desenvolver no mercado — explica ela, exemplificando como a diversidade é positiva: — No Skype, temos uma função “blur”, que desfoca o fundo dos vídeos e ajuda pessoas com deficiência auditiva a lerem o lábio que está na tela. Mas só temos essa ferramenta pois uma engenheira com essa mesma dificuldade pensou nisso. Diversidade é parte do coração do negócio. Sem uma força de trabalho que represente a nossa sociedade, a gente não vai conseguir entregar soluções que sirvam para todos.
Tom Mendes, gerente geral do ID-BR, reforça:
— Isso é bom para o negócio. É bom ter pessoas diversas criando produtos e serviços. Do contrário, você atende um número de pessoas menor, perde mercado.
Veja mais
Haddad desmente fake news sobre taxa para veículos com mais de 20 anos
Citando possível fuga, Moraes nega devolver passaporte de Bolsonaro
AGU pede que Polícia Federal investigue fake news relacionadas ao Pix