Foi William Edwards Deming com seu famoso dictum de que o cliente é a parte mais importante do processo que começou a confusão. Outros vieram e sacramentaram que o “cliente tem sempre razão”. Passou a ser pecado discordar de cliente. Felizmente, uma das vantagens de se trabalhar com startups é que você pode questionar rigorosamente tudo. Pode questionar cláusulas pétreas e participar do processo de derrubada de mitos. Porque o que se busca é entender o melhor caminho e eventualmente descobrir um novo caminho. Ouvir o cliente pode ser uma boa ou uma má ideia, depende do que você está buscando. Fundamentalmente, clientes entendem de problemas, mas não de solução!
O cliente é inteligente e consegue traduzir seu problema particular em uma solução específica, sem necessariamente ser especialista no desenvolvimento de soluções de um modo geral. O cliente não usa metodologia e não tem experiência, apenas pede aquilo que conhece e sobre o que já pensou, aponta o que julga ser a solução ideal. Ironicamente, termina comprando o que o surpreende, o que o encanta, o que de fato resolve seu problema mais agudo da melhor maneira possível, ou ainda pior, o cliente compra aquilo que faz por ele o que antes nem era necessário, mas que de repente passou a ser.
Você deve ouvir sim seu cliente – e de fato ele tem razão – sempre que ele descrever e der detalhes sobre seu particular problema. Afinal, ele é o melhor especialista nos problemas que experimenta. Você deve prestar máxima atenção ao que ele diz, ao que ele vivencia, no quê, mas também no porquê, no como, no quando, no onde e no quem. Não deve discordar e nem contra-argumentar; apenas ouvir e aprender. (E isso é a forma rudimentar do tal “design thinking”).
Você deve continuar ouvindo o cliente, mas agora com bastante parcimônia e com sentidos mais críticos, quando ele começar a descrever a solução que vislumbra para o problema que vivencia. Ouça e aprenda, mas não se deixe enfeitiçar pela solução dele. Não corra para atende-lo, por mais sedutor que isto seja. Em se tratando de soluções, nem sempre o cliente tem razão. Na maior parte das vezes não tem. Perdoe-me o trocadilho, mas “solução não é problema do cliente”.
Aqui vale a máxima do médico que recebe em seu consultório a mãe de primeira viagem. Ele vai atender com carinho e prestar muita atenção na completa e vívida descrição feita pela mãe dos sintomas da criança, mas vai confiar muito mais nos seus anos de estudo e experiência em medicina do que no diagnóstico que ela já trouxe pronto de casa, por mais que este pareça fazer sentido.
Faça perguntas e entenda profundamente as respostas e o entorno dessas respostas. Procure entender o problema por trás do problema. O que de fato aflige o cliente. Pense e aja como uma criança de 7 anos, que pergunta tudo e busca compreender de um modo inteiramente novo o que parece óbvio demais para os outros.
Lembre-se de que ninguém acorda sábado bem cedo com o desejo de comprar um parafuso e uma bucha em uma loja de ferragens. Esta ação já é em si a tradução de um problema em uma solução feita pelo próprio cliente. O problema que de fato o aflige é ter um quadro pendurado na parede. Neste caso, inclusive, a solução “parafuso+bucha” é antiquada. Há melhores soluções no mercado para resolver melhor o mesmo problema.
Mas vale a pena investigar ainda mais a fundo o entorno do problema. O cliente quer um quadro pendurado na parede por quê? Como? Quando? Onde? Com quem? Pode ser meramente uma questão estética. Mas pode ser uma questão emocional. Determinado cliente, no fundo, quer ter o quadro pendurado para surpreender e impressionar a namorada… Então o problema é “impressionar a namorada”. Bem, o roteiro pode ficar mais e mais complexo. E quanto mais complexo, mais dinheiro o cliente estará disposto a gastar por uma solução que seja perfeitamente aderente ao que ele sente de fato ser o “principal problema”.
Se por um lado você deve se responsabilizar pelo processo de identificação e criação da solução, por outro, precisa tomar muito cuidado com a sua participação na definição do problema. Aprendi do Edmour Saiani que você não deve fazer para o cliente o que gostaria que ele lhe fizesse, mas sim o que ele cliente gostaria que fosse feito para ele mesmo. Afinal, você e o cliente são pessoas diferentes, com personalidades diferentes, com emoções e anseios diferentes. Mais um trocadilho: “o problema do cliente é dele, não seu”.
Parafraseando Henry Louis Mencken: para todo problema complexo existe uma solução que é simples, elegante e… completamente errada.
Fonte: Endeavor
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